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(1+1=3) Resenha - Clube de leitura

  • Writer: Flavia Capellari
    Flavia Capellari
  • Jul 11, 2024
  • 3 min read

No primeiro semestre de 2024 me juntei ao Clube de leitura, da Dobra, sobre Psicanálise e Psicoterapia, escrito pela Radmila Zygouris. O livro já havia me sido indicado em supervisão, por conter alguns registros de casos clínicos. Achei que poderia ser interessante revisitá-lo acompanhada de outros leitores de psicanálise. Estava certa. Assim foi que o percorremos, por 12 semanas e um encontro, guiados pela Kathellyn Kazeker. Falamos de psicanálise. Não apenas da prática clínica propriamente dita, mas também de tudo o que a sustenta - dinheiro, teoria, formação, política.


Radmila (como grupo nos autorizamos a chamá-la pelo primeiro nome, em razão da intimidade que criamos com a autora). Radmila, nascida na Sérvia, esteve em São Paulo em 2009, em um encontro organizado pelo Centro de Estudos Psicanalíticos. Nesta reunião proferiu uma fala posteriormente transformada no livro em questão. Como sugere o título, a autora discute as fronteiras entre psicanálise e psicoterapia. Mais especificamente, diria que ela questiona se o que “chama-se” de psicanálise - cabe lembrar que ela falava para psicanalistas - é o que acontece no consultório quando alguém se propõe a praticar psicanálise. Nos faz pensar: se o que é possível na clínica não se adequa às expectativas de uma psicanálise então devemos chamar de outra coisa? Freud já nos disse, há muito tempo, que não. 


O livro se divide em três partes: Psicanálise e psicoterapia; O espaço “entre”; A história do viajante. Na segunda parte, a autora apresenta um relato clínico para demonstrar como a relação analítica é criativa. (Na realidade, o relato evidencia como neste caso clínico a criação conjunta não foi possível). 1+1=3. Analisante e analista pensam juntos, se somam, para formar a análise. Acho particularmente esta construção interessante pois demonstra como a clínica vai além da escuta, por parte do analista, e da fala, do paciente. Tanto pelo fato de que o que se diz e o que se escuta se transformam em outra coisa - viram “3” -, quanto pela luz que esta ideia da autora lança sobre a relação, sobre a participação de ambos os personagens.

 

Por fim, a História do viajante. O relato de uma análise que durou cerca de quinze anos, entre pausas e retornos. Houve períodos em que o paciente esteve preso (literalmente, encarcerado), também esteve muito adoecido, em razão de uma infecção por hepatite C. Um caso com ocorrências drásticas. No entanto, justamente pelo exagero, pelos diversos percalços, interrupções, ausências, mudanças de dinâmica na relação, pude pensar sobre como a clínica também é feita destas oscilações. Claro que, na maioria das vezes, variações mais sensíveis. De todo modo, cada paciente é um paciente, cada história é uma história, cada falta é uma falta.

Pode parecer uma conclusão óbvia, mas, na prática, não é. 


Todos os pacientes são seres humanos, compartilham de uma cultura mais ou menos semelhante, estão inseridos em uma história comum. Como captar e produzir as diferenças, o diferente? Nas palavras da autora: “é preciso uma certa dose de coragem para enfrentar e nomear aquilo que nunca foi anteriormente. Os pensamentos clínicos são as ‘experiências’ de pensamento cujo laboratório é a sessão”. Radmila diz o seguinte: no encontro entre paciente e analista é possível experienciar aquilo que ainda não foi dito, não foi historicizado. E essa experiência, então, pode ser nomeada. A relação com o analista pode produzir outra relação - uma relação diferente - consigo mesmo, com a própria história, com o próprio sofrimento. 


Relato, nesta breve resenha, algumas conclusões da leitura - coletivas e individuais. Vimos, como grupo (1) pensando (+) sobre o escrito (1), a riqueza do material ao possibilitar a abertura (=) para tantos outros temas (3). O sistema de saúde brasileiro e o lugar da psicologia e da psicanálise neste sistema, sobre o início da clínica e sua sustentabilidade, sobre a institucionalização e a formação em psicanálise. Agradeço à Kathellyn, Lucas, Ana Gabriela, Christiane, Marina e Maria Isadora pela companhia, e à Dobra, pela promoção do espaço. Agradeço também às colegas da Trama, que haviam realizado uma leitura conjunta do mesmo livro contemporaneamente, e com quem nos reunimos em mais um encontro, para compartilhar a discussão, ou “metadiscutir”.

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